Sinais de retomada da economia animam seguradoras argentinas
O mercado segurador local encerra seu exercício financeiro em junho com perdas registradas nos principais indicadores, mas a tendência é positiva com inflação controlada em 2025 entre 20% e 25%. Por: Vagner Ricardo
Em meio à tensão social, a partir de recentes protestos liderados por aposentados contra o governo, há uma boa perspectiva de virada de chave da economia argentina neste ano: a profunda recessão pode ser substituída pela maior taxa de crescimento entre os países da América Latina. O Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BID) estão entre as entidades que concordam com a retomada forte da economia. Vale destacar, porém, que a base de comparação é baixa – o PIB de 2024, que deve ter tido queda de 3,4%, facilitaria o resultado de 2025.
De qualquer forma, a troca de viés é muito bem recebida pelos mercados, ainda que haja dúvidas se a recuperação será sustentável. O próprio presidente Javier Milei decretou o fim da recessão econômica em novembro, garantindo que os dias serão menos sofridos em 2025. Na avaliação de Milei, a retomada é uma consequência do fim dos controles cambiais e da redução de impostos.
Dólar e inflação em queda são dois indicadores que poderão, segundo ele, melhorar a qualidade de vida da população, sobretudo dos mais pobres, afetados pelo ajuste promovido pelo presidente argentino. A pobreza é a maior em 20 anos, alcançando mais da metade da população. Já a inflação, cruel com o bolso das classes mais baixas, quase dobrou no início de seu governo, superando os 20% e desacelerando para 3,5% ao mês mais recentemente.
Os apoiadores dizem que essa queda se deve ao corte drástico de gastos públicos, ao passo que seus opositores dizem que a taxa não é sustentável. E, surpreendentemente, o peso – antes depreciado perante o dólar – exibe uma valorização recente, capaz de converter o país em um dos custos de vida mais altos. Entre as medidas incomuns, Milei planeja trocar o peso pelo dólar e fechar o Banco Central.
DESAFIOS PROFUNDOS
O presidente da Associação Argentina de Companhias de Seguros (AACS), Gustavo Trías, assinalou que o primeiro ano do governo de Milei foi marcado por desafios profundos, mas também por avanços macroeconômicos que começam a redesenhar o cenário do país. A inflação, por exemplo, que ultrapassava 200% no final de 2023, desacelerou significativamente, fechando 2024 em 117,2%, com projeções otimistas para 2025 (20% a 25%). Em contrapartida, a pobreza atingiu níveis históricos antes de mostrar sinais de queda, evidenciando a complexidade da recuperação econômica.
Trías reconhece que o setor de seguros não ficou imune a essas oscilações. “O primeiro ano do governo Milei foi extremamente difícil, com o mercado financeiro fechado, déficits gêmeos e baixa governabilidade inicial. No entanto, algumas questões fundamentais começaram a ser resolvidas, permitindo uma visão mais favorável para investimentos de longo prazo.”
Sobre o desempenho do setor, ele lembra que o mercado argentino encerra seu exercício financeiro em junho de cada ano e, de acordo com dados do segundo semestre de 2024, houve um crescimento de 117% no volume de prêmios em pesos na comparação com o mesmo período de 2023, acompanhando a inflação.
Apesar disso, o setor registrou uma perda de 3,2% sobre os prêmios emitidos no período, reflexo do impacto do resultado financeiro negativo causado pela inflação elevada e pelo baixo retorno financeiro dos últimos anos.
“Em 2023, sofremos com problemas severos de liquidez, mas, em 2024, com a recuperação dos prêmios e a queda gradual da inflação, as seguradoras começaram a modificar essa tendência negativa. A estabilização econômica, portanto, pode proporcionar um ambiente mais favorável para o desenvolvimento do setor”, destacou o presidente da AACS.
Para Trías, há um novo cenário macroeconômico em construção. A valorização do peso, a redução do risco-país para o nível mais baixo dos últimos cinco anos e a queda da inflação criam um ambiente mais propício para os negócios, incluindo os de seguros.
Além disso, como o governo aposta na exploração de petróleo, gás, mineração e lítio para impulsionar exportações e reduzir a dependência de importações estratégicas, abrem-se novos nichos para as seguradoras argentinas.
“A consolidação de um modelo econômico com inflação controlada permitirá recuperar a confiança na moeda e estimular ramos e modalidades que hoje estão subdesenvolvidos, como o seguro de vida com poupança e previdência privada, que representa apenas 14% do mercado, enquanto em outros países supera 50%”, explicou ele.
POTENCIAL DE EXPANSÃO
O crescimento econômico projetado para 2025, acima de 4%, deve impulsionar diferentes segmentos do mercado segurador. “Acreditamos que o setor crescerá organicamente, com destaque para os seguros de Automóveis, Propriedades, Obrigações e Responsabilidade Civil . Além disso, vemos uma oportunidade para fortalecer os seguros de Pessoas, que ainda têm grande potencial de expansão”, ressaltou o presidente da AACS.
Apesar da melhora nos indicadores, os desafios permanecem. O Microsseguro, por exemplo, ainda não encontrou um modelo de desenvolvimento sustentável na Argentina.
“O mercado ainda não identificou o melhor canal de comercialização e os tipos de produtos adequados para essa modalidade. Além disso, a carga tributária elevada inviabiliza muitos produtos, dificultando a ampliação dessa cobertura essencial para os segmentos mais vulneráveis”, assinalou.
Segundo Trías, o cenário para 2025 é promissor, mas exigirá adaptação e inovação por parte das seguradoras para acompanhar as transformações em curso.